Tudo começa em 2003, depois do agravamento da crise econômica e social que afeta a Argentina desde o fim de 1990: encerramento de fábricas, colapso dos bancos, explosão da pobreza e do desemprego etc. As ruas preenchem-se de “cartoneros”, esses excluídos que empurram enormes carrinhos e obtêm modestas recompensas pela recolha de papelão e de derivados de papel. Os cafés, esses, estão repletos de jovens escritores cujas portas do mundo editorial se mantêm permanentemente fechadas. Mas, em tempos de crise, o engenho aguça-se e as ideias são a única forma de manter viva a esperança.
Assim, em 2003, o jovem escritor Washington Cucurto e o artista plástico Javier Barilaro criam as edições Eloísa, que levarão ao nascimento, alguns meses mais tarde, da Eloísa Cartonera. “Nós compramos o papelão aos cartoneros que vêm à fábrica com papelão especialmente selecionado. Esse papelão é cortado, pintado e no interior é colado o livro que imprimimos na nossa Multilith 1250. E está feito! É simples e bonito, é um livro de papelão…” escreve Cucurto no manifesto desta editora alternativa.
Eloisa Cartonera existe há já mais de 10 anos e a cooperativa editorial pode orgulhar-se de ver hoje as pequenas irmãs crescerem um pouco por todo o mundo. Na verdade, é já quase uma centena o número de editoras que seguiram o caminho da “mãe cartonera” ao longo destes últimos anos. Sarita Cartonera (Lima, Peru) em 2005, Yerba Mala Cartonera (El Alto, Bolívia) em 2006, Animita Cartonera (Santiago, Chile) e Yiyi Jambo Cartonera (Pedro Juan Caballero, Paraguai) em 2007 ou ainda Canita Cartonera (Iquique, Chile) em 2008, chegando à Espanha (Niña Bonita Cartonera, Zaragoza; Ultramarina Cartonera, Sevilha) e a França em 2010. Nomeadamente Babel Cartonera (novembro de 2010) nascida na pequena cidade dos Pirinéus, Bagnères de Luchon, sob a direção de Daniela Ellias. Depois, em maio de 2011, Cephisa Cartonera em Clermont-Ferrand com Nicolas Duracka à cabeça e mais recentemente a Kartocéros Éditions e Cosette Cartocyclette.
A enorme riqueza de todos esses projetos é a capacidade de produzir o inimitável; a alma de cada uma destas editoras é tão única como cada um dos livros que produzem. A edição cartonera representa bem mais do que apenas livros. É a recusa da histeria tecnológica. A paixão, a energia e a partilha são os valores desta vaga cartonera. Ela responde ao sismo econômico que afetou a Argentina e que afeta a cada dia um crescente número de países. “O que é que eles nos deram? Miséria, pobreza. O que é que lhes damos ? Livros. Para que haja um outro caminho, uma outra porta, uma outra via pela qual seja possível passar” conclui com precisão e humildade Washington Cucurto. Eloísa Cartonera fez com que o livro deixasse de ser um objeto inacessível e passasse a ser uma fonte amplamente acessível de prazer, de conhecimento e de auto-desenvolvimento.
Saiba mais sobre a proposta do movimento cartonero e ajude a construir um mundo com maior bibliodiversidade.
O papelão é coletado nas ruas, estabelecimentos ou comprado de catadores por um preço maior que o do mercado.
O papelão é cortado e dobrado em moldes variados, que se tornarão capas a serem pintadas manualmente.
As capas são pintadas com técnicas mistas pelos próprios editores ou em oficinas oferecidas em diversos lugares.
O conteúdo dos livros é lido, editado, diagramado e impresso para ser encadernado com técnicas diversas.
Os livros são encadernados usando cola, costura ou outras técnicas artesanais às capas pintadas.